segunda-feira, 31 de dezembro de 2012

2013:Saudade benigna

Após mais uma noite de tristeza e quase desespero, me acalmei com a leitura de um trecho do livro que meu marido está lendo. Fiz dele o meu desejo, para mim e para os meus, em 2013:"sabia que aquilo significava que eu aveludava os modos e me ia apaziguando com o destino. eu também o sabia. havia passado o primeiro ano e a dor era  profunda mas talvez começasse a surgir a tal saudade de que ele me falara. aquela saudade benigna que ja não quer magoar mas celebrar o passado." ( Valter Hugo Mãe, em A máquina de fazer espanhóis).

Com alguma esperança, decidi comparecer ao encontro de fim de ano entre amigos. Vou tentar preparar um Ajo Blanco, para oferecer a eles. Vou torcer para dar certo e para ter alguma alegria neste encontro, mediante à falta.

Estou eu aqui às voltas com as irmãs Vic e Vera, assim nomeadas, posto que aquela que batizava os nossos bichos com palavras "esdrúxulas", está faltando. A bichana Vic me lembra ela: branquinha, olhos azuis como contas de Águas Marinhas, enfoguetada.
É assim, nas pequenas coisas, eu me encontro com ela.


segunda-feira, 24 de dezembro de 2012

Sonho bom: torta de abacaxi

Nesta noite sonhei com os meus tempos antigos, adolescente, lá em Cabo Frio, passando férias na casa da família do meu cunhado. Tempos bons, sonho bom.  Acordei assombrada por mais um dia difícil. Meus sonhos parecem vida, a minha vida mais parece um sonho ruim, de quinta categoria.

É como eu desabafei com a amiga Si escrevendo mais ou menos assim "Estou eu aqui perdida, sem lugar. O pai foi ao cemitério levar flores para ela. Eu, não consegui... Para mim, é uma dura realidade do lugar do corpo acabado. Não o lugar da alma dela, que é tudo o que eu queria, sempre. Então não vou, por enquanto. Foi ali que o fim dela foi enterrado junto com o futuro da nossa história com ela. Sinto raiva daquele lugar. Não vou. Prefiro estar com as minhas recordações dela sorrindo, gargalhando e com a saudade do seu cheiro e da sua voz"

O natal em família no Retiro sempre me pareceu alegre e acolhedor, mesmo depois da perda do meu pai. No último ano, a minha família estava inteira, alegre e participou em completude. Minha mãe nos recebeu com a alegria e as engraçadezas de sempre. 

Hoje não tenho mais a mãe e nem a filha mais velha. Não tenho mais o "natal do Retiro. Mesmo assim decidimos fazer um encontro aqui em casa: marido, filhos, algumas irmãs, alguns sobrinhos. Nos reuniremos em volta da mesa que veio de lá, buscando de alguma forma manter a tradição, mesmo sabendo que ela já foi quebrada pelas perdas.

Para tornar minha mãe presente, beberemos espumante e vinho tinto. Para homenagear minha filha, servirei torta de abacaxi.

Ao pedir a minha ajudante para preparar a torta preferida da minha filha ausente, ela se pos a chorar, dizendo que não conseguiria realizar a feitura. Em um grande esforço, mesmo aos prantos, ela conclui o processo.  Por mim, pela Ciça, por ela própria. Obrigada amiga.

Para 12 pessoas, ela usa um abacaxi maduro, fresco, picado, ferventado em um copo de água e 3 colheres de sopa de açucar. Daí, coa a fruta e reserva. Com 1 lata de leite condensado, uma de leite integral, 3 gemas misturadas e 2 colheres de sopa de amido de milha, ela prepara um creme e reserva. Ela forra uma travessa com um pacote de biscoito maizena, sobrepõe metade do creme, por cima assenta o abacaxi picado e coado e por cima, o  restante do creme.

Simples assim! Mas difícil de realizar hoje.

domingo, 16 de dezembro de 2012

Causas impossíveis: Acalanto

É curioso ou mesmo sintomático voltar a morar na mesma quadra, na qual a minha história com ela começou. Foi aqui, nesta mesma vizinhança, que eu cheguei com ela em meus braços no nosso lar, pela primeira vez. Foi por aqui que em várias noites eu acordei para cuidar dela.
É aqui que passo em claro várias noites pensando nela, aflita pela falta dela, despedaçada de saudades dela. Ao amanhecer, escuto as mesmas badaladas de outrora, da mesma Igrejinha de Santa Rita, a santa predileta da minha família original, a das causas impossíveis.

Aqui, ao abrir as caixas de histórias trazidas do outro lugar, percebi que haviam muitos objetos sem sentido, documentos desnecessários, tranqueiras inúteis. Joguei tudo fora. Guardei comigo o principal. Sofri ao me deparar como as nossas histórias principais, boas recordações do passado, mas com a certeza da falta de um futuro juntas.

Tenho ainda muitas histórias encaixotadas. Histórias dela: os livros, os discos, os figurinos de teatro, os escritos. Essas sairão das caixas quando o filho vier abri-las comigo.

Compartilho aqui uma das canções que eu cantava para ela, para nina-la: Acalanto, de Dorival Caymi, numa linda interpretação da Mônica Salmaso.
 Continuo velando por você, meu bem!


terça-feira, 4 de dezembro de 2012

"Filha, não os deixe sozinhos": Passarinhos

"Filha, não os deixe sozinhos", era o conselho que o meu pai nos passava todas as vezes que alguém amado era devastado por alguma perda para a morte. Cresci buscando, se necessário, fazer companhia e confortar as primas e amigas privadas dos pais, às tias e tios privadas dos filhos ou dos maridos, dentre tantos outros em privação eterna de seus amados.

Hoje, num mundo tão cheio de apelos, demandas e compromissos, me vejo só nos meus piores e mais difíceis momentos. A vida continua para todos, exceto para mim e para aqueles que como eu ralam por uma perda para a morte. Para nós a vida pára e nos exclui completamente de qualquer caminho alternativo. A morte é ausência eterna, perda irreversível.

Vive-se um dia (ou cada minuto) de cada vez, enfrentando as faltas espremidas, muitas vezes, pela burocracia do inventário, dos seguros, dos direitos "Pós Mortem". É incrível como a burocracia serve de refúgio besta para a dor da falta. Porém, ela ajuda a postergar a vivência dessa dor. E eu corro atrás da burocracia, como uma saída para sobreviver.

Hoje eu sei que a dor irreversível da perda, da falta, da saudade, da ausência, é desprovida de cálculo, um cálculo que a burocracia faz facilmente. Mas sigo, juntando documentos, tirando cópias autenticadas, inclusive de um atestado de óbito que eu nunca li.  Espanar da minha vida este mofo da burocracia, sei não, pode ser pior, por enquanto.

Nesta época do ano, eu sempre postava neste blog, idéias para as festas de final de ano como aquiaqui e aqui". Eu adorava o final do ano e a chegada do verão: festas, encontros familiares, férias na praia. Só alegrias. Em 2012, o ano que me passou a perna,  não vou enfeitar minha casa, não vou comprar presentes, não quero cozinhar. Não quero evidenciar a perda, a ausência e a falta da filha e da mãe. Às vezes fico impressionada com a capacidade dos humanos resistirem a tanto.

Dizem os chineses: "Felizes são aqueles que enterram seus pais". Eu fui feliz, até há pouco tempo, pude enterrar meus pais. Mas hoje, sou uma infeliz... Não existem palavras para explicar isto.

Lya Luft, frente à perda de seu marido se aproxima um pouco da minha revolta mediante a tal contigência.

"Não falem alto comigo:
andem sempre na ponta dos pés.
Principalmente, não me toquem.
Finjam que não vêem se tenho um jeito absorto,
se nem sempre entendo as perguntas
com a rapidez de antigamente,
se pareço fatigada
e sem graça como nunca fui.
Não me interessa nada o cotidiano nem o místico.
Não quero discutir o preço do mercado
nem os grandes mistérios da eternidade.
Façam silêncio ao meu redor."

Como superar tal amargura? Tom? Passarim? Eles estão à toda nesta época do ano, reproduzindo...



UM VIVA PARA O NOSSO MAESTRO!!!
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